Só nós dois

sábado, 24 de outubro de 2015



 
 Parece-me Alfama
 
"Porque estas coisas de que eu lhe falo — Maluda não fala, ri — não aconteciam uma ou duas vezes por semana, mas sim todos os dias, pela noite fora, até às seis e sete da manhã. Eram madrugadas feitas de conversa e laracha onde eventualmente o fado acontecia, como quando a Amélia começava a cantar, já depois das três da manhã, na Taberna do Embuçado, do João Pereira Rosa, só para meia dúzia de amigos. 
 
“E antes de irmos tomar o pequeno-almoço à Ribeira ou a casa de um de nós, porque àquela hora já apetecia tomar um café, ainda dávamos um pulo à Cova do Galo, onde actuavam o Pepe e o Sivuca. 
 
"Mais tarde — recorda Maluda — e com características diferentes, surgiu o Botequim da Natália Correia, com toda aquela `entourage' de poetas e gente ligada à literatura, com a Maria Paula a cantar versos que faziam a caricatura, sempre actualizada, dos acontecimentos políticos."
 
Contudo, a vida nocturna não se limitava a estes locais. Abertos até tarde e muito mais acessíveis, os cafés também faziam parte da noite, abrigando um outro tipo de gente ao qual, a partir de uma certa hora, se juntavam os espectadores do teatro de Revista ou do S. Carlos, ávidos de uma boa ceia. Havia mesmo alguns cafés que só fechavam das cinco às seis da manhã "para limpeza deles e dos  clientes".

 



Casa de Férias Aiola. Galapos, Arrábida. Será Eduardo Anahory que está sentado?
Foto de ulhtpa1.blogspot.pt


Homem de múltiplas paixões e talentos, aventureiro e vanguardista, foi cenógrafo, artista plástico, escultor, publicitário, artista gráfico, decorador, pintor... E arquiteto sem curso. 

Casa de Férias Aiola. Galápos, Arrábida, construída em 1959/60 (?). 
Fotos de ulhtpa1.blogspot.pt


Casa de Férias Aiola. Galapos, Arrábida, planta (?). 
Foto de infohabitar.blogspot


Oriundo de uma família de origem judaica que teve um papel fulcral no nascimento da Comunidade Israelita de Lisboa, Eduardo Anahory nasceu no Bairro Alto, frequentou a Escola de Belas Artes na capital e mais tarde a do Porto. Mas deixou o curso de Arquitetura a meio, o que o obrigou a recorrer, ao longo da vida, a arquitetos amigos, como Pedro Cid, Alberto Pessoa ou Manuel Alzina de Meneses para autenticar os seus trabalhos – a maioria de construção efémera e daí ser a sua obra tão escassamente conhecida.


Casa de Férias Aiola. Galapos, Arrábida. 
Foto de ulhtpa1.blogspot.pt





Reliquia do passado

Uma Obra



Vida e obra*

1917 – Nasce em Lisboa, a 16 de Dezembro
1931 – Inicia a atividade como ilustrador
1935 – Ingressa no Curso Especial de Arquitetura da Escola de Belas Artes de Lisboa
1937 – Transfere a matrícula para a Escola de Belas Artes do Porto. Participa como decorador no Pavilhão de Portugal na exposição de Paris, concebido por Keil do Amaral
1939 – Trabalha no Pavilhão de Portugal da Feira Mundial de Nova Iorque, encomendado ao arquiteto Jorge Segurado
1940 – Participa na Exposição do Mundo Português em Lisboa, integrado na equipa de “pintores-decoradores” do Pavilhão das Artes e das Indústrias
1940 – Embarca para o Brasil, onde viverá cinco anos, colaborando na realização de várias exposições com Oscar Niemeyer, Eduardo Reidy, Jorge Moreira, Roberto Marcelo, entre outros 
1942 – Participa como cenógrafo em peças teatrais no Rio de Janeiro
1945 – Regressa do Brasil num veleiro. Casa pela primeira vez, com Maria Reyna Lima Leal Baumberg. Organiza a sua primeira exposição individual de desenhos, óleos e guaches em Portugal. Parte para Paris, a convite do célebre dramaturgo Louis Jauvet, onde viverá até 1948 e onde se dedicará à cenografia e às artes gráficas 
1948 – Regressa a Portugal, integrando a equipa do arquiteto Jorge Segurado na adaptação do Pavilhão das Artes e Indústrias à função de Museu de Arte Popular
1952 – Viaja ao Brasil a convite do arquiteto Oscar Niemeyer. Desenha o Pavilhão do Instituto Brasileiro de Café e expõe projetos de painéis decorativos nos museus de Arte Moderna de Rio de Janeiro e São Paulo
1955 – Casa de fim de semana, em Alportuche, na serra da Arrábida
1957 – Com Orlando Costa, dirige a agência de publicidade Marca
1958 – Divorcia-se e passa a viver com a pintora Menez. Trabalha no Pavilhão de Portugal da 1.ª Exposição Internacional e Universal do pós-guerra, em Bruxelas, encomendado ao arquiteto Pedro Cid. Ganha o concurso para o Pavilhão de Portugal na Feira de Munique. Concebe o espaço interior do café restaurante Vává, em Lisboa.
1959 – Reabilitação da Casa da Azenha em Loures. Bar do Restaurante Folclore, em Lisboa. Decoração de um quarto do Hotel Ritz
1960 – Casa de férias Aiola, em Galapos, na serra da Arrábida (mais tarde veio a ser adulterada para receber a discoteca Seagull, que ficou destruída em 19 de novembro de 1998 devido a uma explosão de gás). Participa na execução de cartazes nas campanhas de publicidade da TAP
1961 – Bloco de apartamentos em Galapos, na serra da Arrábida (demolidos em 1986 no âmbito de um programa de reordenamento do território)
1962 – Hotel de Porto Santo, Madeira 
1963 – Viaja pela Finlândia com uma bolsa de estudo do Instituto de Alta Cultura. Hotel de Porto Santo, com Pedro Cid
1964 – Termina a relação com Menez 
1967 – Piscina flutuante: uma grande jangada constituída por elementos modulados em poliéster reforçado, em cujo centro ficava instalada uma piscina com paredes e fundos perfurados, de modo a que a água fosse permanentemente renovada e filtrada (esteve montada, no verão de 1967, na Praia do Tamariz, no Estoril)
1968 – Cria um Gabinete de Estudos, que passa a trabalhar em estreita ligação com o gabinete de arquitetura de Manuel Alzina de Meneses e Erich Corsepius
1969 – Casa com a atriz Graça Lobo
1971 – Casa do Alto dos Píncaros, na Biscaia, Cascais (desenhada para sua habitação, hoje está adulterada e é explorada por uma empresa que oferece alojamento e outros serviços a surfistas). Participa no projeto de adaptação das instalações da Companhia Mineira do Lobito, Angola, projetadas pelo arquiteto António Campino, a Hotel Presidente 
1972 – Divorcia-se de Graça Lobo 
1974 – Volta a viver no Brasil, na sequência da Revolução de 25 de Abril
1983 – Expõe a sua pintura no Rio de Janeiro
1985 – Morre em Lisboa, no dia 16 de Junho

*com base na dissertação de José António Brás Borges para a obtenção do grau de Mestre em Arquitectura, intitulada “Eduardo Anahory, percurso de um designer da arquitectura” (IST/2010)
 

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